#9 - Nunca peça para parar -
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Há oito anos, numa tarde de inverno em São Paulo, conheci meu ex-marido. Ele, estrangeiro recém-chegado ao Brasil, era muito gentil e sedutor. Logo de início, me fez sentir muito amada e desejada através de demonstrações de afeto, elogios, promessas de casamento e muitos planos juntos. Ele tinha muita pressa para se casar – dizia que a nossa situação era diferente. Eu sabia que ele ansiava pelo passaporte brasileiro, mas acreditava no amor que sentíamos um pelo outro como maior do que tudo. A aliança em meu dedo e o sonho do casamento me inebriaram. Em apenas seis meses nos casamos e fomos morar juntos. Os abusos emocionais logo começaram a aparecer: “você vai à praia de biquíni? Sua bunda está caída...”; “não gosto da comida desse jeito, vou te ensinar como a minha mãe faz”; “você não sabe se vestir, use estas roupas lindas que comprei pra você”; “você deveria se depilar mais”; “esse seu jeito não é feminino”; “suas amigas são falsas e invejosas, não conte nada para elas sobre o que se passa entre a gente”; “que burra, isso não é assim...” Os estupros maritais também eram frequentes: “como assim você não está com vontade? Somos casados e sou fiel a você”; “nunca peça para parar antes de eu terminar”. Durante os quatro anos de casamento os abusos foram se intensificando e eram intercalados por alguns afetos, os quais, ao final, desapareceram por completo. Na última viagem que fizemos juntos para visitar a família dele, ele deu um tapa no meu rosto e na sequência me empurrou contra o chão. Ao mostrar para ele o hematoma na minha pele, ele afirmou: “você que fez isso escondida no banheiro”. Comecei a arrumar minha mala, pois queria voltar ao Brasil, o que ele não permitiu: “você só sai do país com a minha autorização”. Tive uma infecção urinária muito forte durante a viagem em razão dos estupros maritais e ele menosprezou minha dor: a do corpo, e a da alma. Sozinha, tive de agendar uma consulta médica e ir ao médico em um país totalmente estranho onde eu não falava a língua. Me senti totalmente desamparada. Ao retornarmos ao Brasil, não sabia mais quem eu era. Estava isolada da minha família e amigas. Muitos me julgaram por estar naquela situação, como se a culpa fosse minha. E era assim mesmo que eu me sentia: culpada, incapaz, impotente, doente. Desenvolvi uma doença autoimune e só muito tempo depois fui compreender a relação com as violências sofridas. Na época eu não sabia sequer que eram violências.  Quando falei em separação ele não aceitou. Ficava dias, às vezes uma semana inteira sem falar ou olhar para mim para me punir. Aquilo me matava por dentro.  Quando ele já tinha a cidadania brasileira e não havia sobrado mais nada de bom para extrair de mim, me descartou como se faz com uma roupa velha. E por isso eu agradeço, pois foi a melhor coisa que me aconteceu. Eu não teria forças para sair daquele relacionamento sozinha. Apesar de horrível, era tudo o que eu tinha. Ainda hoje trago as marcas deste relacionamento abusivo. A terapia, o profundo processo de autoconhecimento, meu trabalho e minha rede de apoio de mulheres foram ferramentas essenciais para recomeçar. As feridas se fecharam, mas as cicatrizes estarão sempre aqui, para me alertar sobre qualquer outra situação de perigo que eu possa me deparar. Não sou mais uma vítima, mas uma sobrevivente escrevendo novos capítulos da minha história, da qual hoje posso ser a própria autora e protagonista. Se eu pudesse voltar lá, falaria para aquela mulher cega: cai fora daí! Existem muitas outras coisas no mundo pra você amar e viver, e não precisa de um homem ao seu lado pra te validar como mulher! #ghostwriter #sozinhadesi #historiasanonimas #rededemulheres #escrita #cura #abuso #vulnerabilidade #generosidade Lembrando que o Podcast Sozinha de si é um projeto de acolhimento através de histórias anônimas, manda a sua h
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Published 10/28/24
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