Há cerca de cinco anos, minha mãe sofreu seu primeiro AVC (Acidente Vascular Cerebral Isquêmico), que comprometeu sua função cognitiva. Após esse episódio, ocorreram alguns AVCs transitórios. Como consequência, ela desenvolveu Demência Vascular, cujos sintomas são semelhantes aos do Alzheimer.
Passei por quase todos os processos de enfrentamento de algo extremamente doloroso e difícil de aceitar: negação, revolta, profunda tristeza e, por fim, aceitação. Pulei a fase da barganha, que seria a segunda nessa lista. Minha relação com Deus não admite barganhas; tudo o que acontece tem um propósito.
Mas, para mim, conviver com essa nova realidade tem sido complicado. Lidar com a confusão mental dela, as constantes mudanças de humor e o fato de ela não reconhecer a casa, as coisas e até as pessoas é muito desafiador. O que mais dói, porém, é vê-la sofrer como se estivesse vivenciando a morte de sua mãe, pai e irmãos, repetidamente experimentando a angústia do luto.
Enquanto isso, sinto como se estivesse em luto por uma mãe que ainda vive. Às vezes, chego a sentir saudades dela. Nesses momentos, me agarro à ilusão de que, se eu gritar “mãe, aqui é sua filha”, ela olhará para mim com aquele olhar amoroso, aquecendo meu coração com seu abraço, permitindo que eu chore em seu colo enquanto acaricia meu cabelo. Escuto-a dizendo que tudo vai passar, que continuará comigo e que nunca esquecerá de mim.
O ser humano é extremamente carente de amor; afinal, em nossa essência, somos feitos de amor. Diante da minha imperfeição, sofro quando, às vezes, ela não me reconhece como filha, me privando do seu amor. Resta-me pedir a Deus que permita que ela passe mais tempo aqui comigo e que eu nunca perca a esperança de ver sua lucidez voltar, mesmo que entre delírios e alucinações.
O dia a dia com ela é bastante desgastante. Quando chega a noite, sinto como se tivesse participado de uma maratona. Não tenho muito apoio dos familiares, inclusive dos meus outros três irmãos. Uma irmã tem Parkinson precoce (eu também tenho), a outra não ajuda porque diz que também é doente, e meu irmão afirma que não tem tempo. Recentemente, contratei uma pessoa para me ajudar com as atividades de casa, pois não estava mais aguentando fazer tudo sozinha.
Durante o dia, minha mãe tem episódios de lucidez, mas, na maior parte do tempo, ela fica desconectada da realidade. Isso traz delírios, alucinações e até agressividade. Ela puxa meus cabelos, arranha meus braços... Mas não sinto raiva quando isso acontece, pois sei que não é ela que age assim. Minha mãe nunca faria isso; ela nunca bateu em nenhum dos filhos.
A respeito da minha infância e adolescência, essa é uma outra história que pretendo contar posteriormente, se vocês permitirem. Quando divulgarem, acredito que alguém irá lacrimejar. Não é uma história bonita, mas garanto que é verdadeira.
Hoje, ao olhar para minha mãe, percebo um olhar vazio, como se a alegria de viver estivesse se extinguindo para sempre. Nos momentos em que ela se desconecta da realidade, costumo dizer que ela vai para outra órbita ou planeta. Mas quase todas as noites, quando vai dormir, ela retorna desse lugar para me dar a bênção: “Deus te abençoe, minha filha”, ela diz. Para mim, isso soa como um bálsamo que aquece minha alma. É nesse momento que escuto a voz de Deus dizendo: “Filha, não se preocupe, estou cuidando de vocês.” Aí, consigo adormecer sentindo o imenso amor de Deus por mim.
Lembrando que o Podcast Sozinha de si é um projeto de acolhimento através de histórias anônimas, para cuidar de todas de uma vez! Manda a sua história pra mim:
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